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3.7 chegou!

Eu tenho sentimentos ambivalentes muito conflitantes sobre aniversários. No do ano passado, eu sabia que era o último. Tinha planos, metas e certezas. Esse, tenho ressignificado tanta coisa, que me convenci experimentar deixar fluir. Como diz na canção do Iron: RUN, LIVE TO FLY, FLY TO LIVE, DO OR DIE! 

Todas as minhas lembranças de infância são ruins. Todas! As vezes eu cavo, cavo, cavo. Busco nas minhas profundezas, algo de bom, algo que aqueça o coração. Quanto mais eu lembro, mais dói. Então eu recuo, enterro novamente e desisto. Com aniversário, não é diferente. 

A memória de aniversários até uns onze ou doze anos (não sei direito, não tem registro, não tem foto), é do café da manhã na padaria. Era somente eu, meu irmão e meu pai. Mãe nunca se importou. Era a melhor refeição do ano. Único momento em que eu me sentia gente. Eu podia escolher o que comer e o que beber. Eles acompanhavam. No do meu irmão, a mesma coisa. Ele escolhia e a gente acompanhava. Sempre na mesma padaria. Eram os melhores minutos do ano. O tempo parava ali. Normalmente escolhia misto quente com guaraná. A gente não saia nunca. Esse era “o” passeio! A gente também passava muito aperto e esse era o auge do luxo, a experiência gastronômica perfeita.  

Só que mesmo a melhor memória, não esconde o que tinha por volta. Os dias antes eram de muita ansiedade. A gente torcia muito para o pai não beber. Sabia o inferno que era o dia que ele bebia. E ele bebia todos os dias. Ele também tinha epilepsia. Ou ele estava bêbado, ou ele tinha incontáveis ataques no dia. Não tomava medicação porque não poderia beber álcool. Um ciclo intenso e sem fim. Enquanto éramos crianças, ele conseguiu ficar sóbrio nas manhãs dos nossos aniversários a tempo de nos levar na padaria. Só que nunca conseguia voltar sóbrio da padaria conosco. Não conseguia finalizar a refeição sem pedir a branquinha. A gente via nitidamente o conflito dele. E voltávamos para casa tristes, com as lágrimas silenciosas, abraços nulos e afeto zero. Mais tarde o pai chegava com todas as outras dificuldades e a vida real rasgava todas as ilusões de pertencimento, de se sentir especial, de poder ser feliz. 

Outro ponto importante é que nos anos 80 e 90 não tínhamos internet, nem mesmo telefone. Nunca tive muitas amizades. E minha mãe faz aniversário um dia depois de mim. Eu sempre recebi parabéns no dia seguinte porque as pessoas deixavam juntar e aproveitar a viagem. Mais ainda, meu irmão faz quinze dias depois. Então a outra metade; eu recebia nesse dia. 

Conforme fui crescendo, pouca coisa mudou. Melhorou com as redes sociais. Eu que nunca soube lidar direito. Será que estão lembrando de mim porque sou importante para elas ou estão automaticamente respondendo a notificação do aplicativo!? Meu ex marido costumava comprar um bolo para mim. Era ótimo. Intimista. No último ano que estivemos juntos, ele comprou também. Só que a gente estava separando. Não estávamos conversando direito. Na noite anterior ele nem dormiu em casa, nem teve bom dia, nem olhou na minha cara no almoço… A noite um bolo. Foi bem esquisito. Essa coisa de esperar o ano todo por um único dia. É insano! Não quero nesse dia o que não tenho nos outros. Ontem, eram onze horas, estava cozinhando (sim, faço almoço cedo), minha mãe levantou (sim, ela acorda tarde), como de costume, dividimos a cozinha sem uma palavra, sem cruzar o olhar. Então sendo aniversário, terá um sorriso e um abraço. Essa parte eu odeio! Eu sequer costumo dar presente nesse dia. Prefiro presentes avulsos em dias comuns. Presentes inesperados. Momentos, lembranças, conexões. Claro que é gostoso ganhar presente! Toda minha infância foi sem presente. Minhas tias faziam bolinho para mim. Dividia com a mãe. Era muito gostoso. Nos últimos anos também ganhei bastante carinho de gente que amo. É maravilhoso! Sempre mantendo a máxima do “não esperar para não se frustrar”. Que é bem triste, convenhamos.

Um estalo que me fez repensar a vida toda foi o dia que enterrei meu pai. Nunca me senti tão sozinha. Percebi que não tenho uma rede minha. Tudo que construí foi pelos outros. Pela família que tentei criar. Já estava em crise com o marido. Ele pouco esteve ao meu lado. Não tinha nenhuma amiga ali. Tinha toda a família, foi essencial! Mas todos ali estavam chorando, cada qual, sua própria dor. Eu não tive ninguém para chorar minha dor comigo. Meu irmão recebeu vários amigos. Minha mãe recebeu vários amigos. Meus familiares receberam seus amigos. Eu estive sozinha. 

Outro dia numa conversa, me perguntaram o porquê de eu não beber. Respondi que pelo histórico do meu pai e pelas crianças. Que elas já não tem pai presente, que eu sou sozinha e sou tudo que elas tem. Elas precisam de mim alerta cem por cento! Não posso relaxar. Recentemente tive uma crise de labirintite, fiquei muito ruim, continuei dando conta de tudo de modo sobrenatural. Até que desabei. Precisei tomar uma medicação forte que me apagou. Eu nem sei se alguma outra vez eu dormi tão bem, acho que nunca. Acordei renovada. Foi bom só até saber que meu caçula passou mau a noite e a mais velha que o socorreu. Fique ruim em dobro com o peso da minha falta com um e com a carga que ficou na outra. Mãe não tem paz nem para ficar doente. Muito menos para morrer. Quem vai cuidar? Ninguém vai usar o “incondicionalmente” como eu. E o que será da cabecinha deles? Poderão aguentar isso da mãe? Como garantir que não sentirão culpa apesar de não terem. 

Eu poderia dizer que vivia no piloto automático. Mas bem pior que isso. Eu sempre vivi por obrigação (não vou estender esse ponto pois daria mais 3 capítulos, no mínimo!). Quando chegou a pandemia, depois do susto me veio um alivio esperançoso secreto. Senti que teria a chance de partir, quietinha, sozinha e com um bom álibi. Só que o sentimento foi substituído pelo pânico de não ser eu. De eu perder alguém que amo. Eu não suportaria viver tendo perdido um filho. E ai eu pirei! Senti a pandemia da pior forma possível. Muito pesado e solitário, como foi para muita gente…

Em outra conversa, um amigo contou que via sua mãe não como uma pessoa, sim como um espectro. Ela sempre estava presente, sempre ali para eles porém nunca estava realmente ali. Isso me atravessou de uma forma dolorosa. Percebi que era assim que minha filha sempre me viu. E sempre tentou me alertar mas eu nunca pude escutar. A pressão da vida adulta, das responsabilidades, da maternagem, cegam qualquer pessoas. E se você não tem apoio, você sucumbe. 

No ano passado minha filha completou dezoito anos e isso foi um outro grande divisor de águas para mim. Como se a maioridade dela, me libertasse para voltar a ser eu, por mim. Mesmo com os meus filhos ainda criança. Era como se eu tivesse passado de fase. E pudesse respirar. A sobrecarga da maternagem solo é uma coisa imensurável. Cruel ao extremo! Eu me vi podendo pensar em mim. Eu desamarrei minha mãe das minhas costas também. Eu agora só tenho nas asas dois filhos. Sem marido, sem mãe, sem filha mais velha. Continuo disponível só que agora com poder de escolha em me colocar no podium as vezes. 

Há um ano eu estava muito destruída. Noites e mais noites em claro; incontáveis crises de pânico e ansiedade. As noites eram desesperadoras e pela manhã eu fingia estar tudo bem. Colocava minha capa de mãe e seguia. Por dentro tudo estragado. Comia as unhas até sangrar. Me fechava para as pessoas pois achava que já tinha tido minhas oportunidades de relacionamento e que para o resto da existência, deveria aceitar a rejeição. Cumprir a missão de criar os filhos. E quem sabe um dia poder partir. Porque é certo que eles irão. Irão desbravar o mundo, irão viver suas próprias vidas, seus próprios desejos e ambições. E se hoje que apenas um filho voou, já não sei o que resta de mim, imagina quando forem os três. É o natural e é inevitável. O cérebro entende. O coração…

Eu não olhava para o céu. Achava normal, achava que amanhã tem igual de novo. Bobagem. Ha alguns meses eu comecei olhar para o céu. Comecei ver beleza ali. Comecei admirar e me encantar com cada detalhe. Eu virei a pessoa obcecada pelo céu. Apaixonada. Tenho dependência de ficar observando todo dia. Meu olhar mudou para muita coisa. Abri as portas do meu casulo. Tenho saído para respirar com frequência. Tenho necessidade de conversar sem o assunto ser filho. Voltei me enxergar como mulher, como pessoa. Eu nem estou saindo mais dos grupos do WhatsApp, estou respondendo todo mundo em poucas horas, não mais em dias, semanas. Deus está vendo o quanto tenho me esforçado para socializar! Parei de dizer aquele não automático para tudo. Disse mais sim nos últimos meses do que na vida toda. Ainda sou bem malvada comigo porém sempre paro para refletir depois e até já aprendi me pedir desculpas.

Dizer sim para a vida, não faz ela ser fácil. Faz ser menos dolorosa. Continuo quebrando a cara periodicamente mas o que compensa é que tenho me recuperado mais rapidamente e com menores sequelas. Nem sempre, é verdade! O mínimo que for, já é lucro! Agora ver o que me espera nos 37. Para o dia, pela primeira vez, planejei algumas coisinhas que eu gosto de fazer com a minha doce companhia. Nem vou falar em voz alta para o universo não ter chance de puxar o tapete. 

Estou pronta! Bora!? 

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Origami Envelope Coelho {DIY}

Envelope de coelhinho de origami (EU SEI QUE ORIGAMI NÃO USA TESOURA E COLA MAS EU QUERO CHAMAR MINHA DOBRADURA DE PAPEL DE ORIGAMI, ME DEIXA!). Fiz com papel espelho, 1 quadrado de 20X20cm. Poder ser com qualquer tipo de papel e de qualquer tamanho desde que seja um quadrado com as medidas iguais.

Inspirem-se! (ˆ◡ˆ)♥

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04/05/22

Eu tenho o hábito horroroso de menosprezar tudo que é meu e engrandecer tudo que é do outro. Pra mim é natural vibrar com as vitórias dos outros, com as conquistas dos outros, com as evoluções dos outros. Tenho muita facilidade em me compadecer com erros, defeitos, fraquezas dos outros e o extremo oposto com os meus. Minha síndrome impostora é cruel. Quando eu acho que me desvencilhei, percebo que estou presa, estática, submersa em seus terríveis tentáculos mais uma vez. 

No último fim de semana vivi uma experiencia fantástica. Única. Transcendente. E o que eu fiz? Diminui! Fiz alguns stories mas não queria fazer uma postagem. Achei sem graça, sem importância. Tanto faz. Ninguém se importa. Nesse momento eu quero sim registrar. Quero sim engrandecer aquele fato que foi tãooo mágico e importante para mim. Que aconteceu do jeitinho que precisava. Foi perfeito. Sem defeito! 

A Pitty é minha artista favorita da vida! Desde a primeira vez que ouvi, a primeira vez que vi. Seu som é o meu preferido, sua imagem a minha idealização. Suas composições, motivacionais. Sua voz, maná. O conjunto da obra, impecável! Seu primeiro álbum saiu no ano em que eu completei 18 e estava gravida. O ano mais difícil da minha vida. Minha menina ouvia desde a barriga. Cantava desde pequenininha. Meus meninos ouvem, cantam e gostam também.  É o tipo de pessoa que eu nem queria conhecer pois prefiro manter no pedestal. Não gostaria de borrar nem que minimamente sua imagem com a humanidade que ela tem. Ver suas imperfeições, dores, dissabores. Prefiro manter como um ser supremo. A Pitty sempre me salvou e continua me salvando todo dia mesmo sem saber da minha existência.

Tinha vontade de ir em um show dela mas nunca achei que fosse algo para mim. Muito fora da minha realidade. Na verdade só havia ido em um show na vida, e foi recente, há 3 anos. Sandy e Junior, um ato de ousadia, experiencia deliciosa com a minha prima/ irmã. Não me achava merecedora. Até que… Surgiu a oportunidade. Pitty perto da minha casa. Num lugar bem gostoso que eu sempre quis ir. Ingresso super acessível. Mais Nando Reis. Eu nunca me perdoaria se perdesse. Queria companhia, obviamente. Não consegui. O medo nem era a solidão, isso já aprendi lidar e quase sempre, administro bem. O pânico era da hora de vir embora sozinha. Realmente foi a parte mais difícil! Vencida com sucesso. 

O dia do show foi de extrema ansiedade. Noite anterior em claro. Levantei cedo para rotina com os filhos. Tentei cochilar a tarde para ir descansada. Em vão! Coração acelerado a ponto de pifar o dia todo. Sem acreditar que o sonho iria se realizar. Eu iria ocupar o mesmo espaço que minha ídola. Iria ver e ouvir pessoalmente. Eu sou uma pessoa introvertida e utilizo algumas técnicas de invisibilidade. Não queria chegar muito cedo. Nunca quero estar em evidencia. Nunca quero aparecer. Lugares com muitas pessoas são bons para passarmos despercebidos. (Só quem já teve costume de chorar no metrô de SP entende como quanto mais gente ao redor, menos as pessoas se enxergam) Li na plaquinha que a capacidade do local era de quase 3 mil pessoas, pouco comparando com o outro show que fui e tinha quase 50 mil. Ainda assim era muita gente! O lugar bonito, amplo, com bares, chalés, lago, árvores. O palco e a área da pista cobertos com um telhadinho rústico super charmoso. O nome antigo era Kazebre. Faz jus!  Ainda estamos vivendo uma pandemia, permaneci com a máscara o tempo todo. Só observei mais 2 ou 3 pessoas com ela também. Tive vontade de tomar uma bebida mas decidi manter a atenção plena e diminuir a vulnerabilidade especialmente por estar desacompanhada. Não troquei uma palavra com pessoa alguma. Circulei com facilidade até me posicionar na pista para aguardar o inicio das apresentações. 

Já tinha bastante gente quando a primeira banda abriu a noite. Engrennagem. Que deliciosa surpresa! O som muito bom! Os caras com uma energia e entrega contagiantes. Tocaram musicas deles e de outros. A galera curtiu muito! Depois de uma pausa e mais gente na pista,  veio o Nando Reis. Pontualidade impecável, até adiantou uns minutos. Ponto positivo. Melhor que isso só o fora bolsonaro que ele lançou no meio da apresentação. Um artista experiente, muito desenvolto e entregue. Todas as canções cantadas do inicio ao fim em conjunto com a plateia. Eu nem sabia que gostava tanto dele. Foi maravilhoso! O cansaço já batia no intervalo que antecedia o ponto alto da noite. Quando deu a hora, a galera em polvorosa já aclamava: “Pitty, cade você, eu vim aqui só pra te ver.” Depois de mais 15 minutos, o som começa. Foi ai que minha alma parecia ter saído do corpo. Os pés saem do chão. A multidão toda é empurrada para frente. Medo de acontecer um acidente. Tudo aquilo é insano. Os sentimentos explodindo. Soltei o freio e me permiti ser levada pelo fluxo. Todos estávamos na mesma vibe. Íamos para frente, trás, esquerda, direita. Girávamos. O som ocupava todo o ambiente. A energia era surreal. A música rolando e eu nem tinha conseguido ver o palco. Só sentindo. Sentindo ao extremo. Pulando, gritando, cantando, suando, chorando. Em êxtase! Acabou a primeira música, ela falou conosco e já emendou mais uma e mais outra e mais outra. O som muito mais pesado e gostoso do que o rotineiramente editado midiático. Eu nem sabia se queria fechar os olhos e sentir ou se queria os olhos bem abertos para registrar. Vivi tudo intensamente! Tirando as vivencias maternas, essa foi sem dúvidas, a melhor coisa que já aconteceu na minha vida! O momento mais intenso e delicioso que vivi! Eu estava plenamente realizada e entregue! Quase no final, o corpo exausto, me abriguei entre três casais heteros que curtem o show agarradinhos e grudados no chão feito muralha. Pude recuperar um pouco o fôlego. A despedida foi sofrida. Não queria que acabasse! Felizmente teve um bis e consegui ultrapassar as barreiras e fiquei pertinho do palco. Meus olhos incrédulos puderam ver de pertinho minha deusa. Poder viver um momento incrível e ter ciência do quão incrível ele é, no momento presente, é um presente fantástico!  

Tudo aconteceu exatamente como deveria ser. Agora entendo que realmente eu precisava ter ido sozinha. Não me preocupei com nada nem ninguém e me permiti viver aquilo intensamente. E mais, pude abraçar minha solitude, reconhecer meu poder e minha força, me conectar aos meus próprios desejos e me sentir poderosíssima! Nem que por poucas horas…. Foi absurdamente potente e importante para mim! 🖤

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29/04/22

Era um dia comum. Mas o que é um dia comum? Nunca é apenas um dia comum. Só vamos perceber se foi um dia simples ou extraordinário depois dele ter acabado.

Era um dia normal. Tudo acontecia na frequência adequada, calma. No meio da tarde uma reunião de pais na escola do filho. Escola nova do filho. Ele no sexto ano do ensino fundamental 2. Agora separados por ciclos, ele precisou sair da que ele já estava habituado. Escola em que eu estudei. Da primeira série ao terceiro ano do ensino médio. Todas as minhas lembranças escolares são dali. Ele com certa dificuldade de adaptação pelo combo escola nova/ amizades novas/ ciclo escolar novo/ pós dois anos de pandemia sem contato com pessoas fora da bolha/ introversão/ pré adolescência. Ufa! Se tivesse dado tudo certo, com certeza estaria tudo errado por baixo do pano. Aliás, isso é importantíssimo! Reconhecer que tem algo errado, algo que precisa de conserto, de ajustes, de reparo, de dedicação para poder fluir. Nisso de reconhecer as limitações, as particularidades de cada um, nossa geração, com fé, se encaminha para dar o acolhimento que tanto desejamos e não tivemos no passado. Cada colo que ofereço para minhas crianças, me rasgam por não ter tido colo também. Cada ferida que os ajudo a cuidar, me ferem por não ter tido ninguém enxergando as minhas. Cada dor deles, me dói em dobro por não curado as minhas e por não ter podido evitar as deles.

Era um dia percorrendo um caminho habitual. Abrindo o leque das infinitas possibilidades, singularidades, pluralidades, comecei observar também as belezas corriqueiras, cotidianas. Eu queria ter como fotografar as belezas que enxerguei no caminho. A parede cheia de trepadeiras, os homens trabalhando em uma obra para consertar um encanamento jorrando água no meio do concreto, as linhas bem desenhadas da lombada, a câmera de segurança redondinha de uma casa, o alinhamento do ponto de ônibus e uma fila de carros que seguia, o cone de trânsito, o telhado do conjunto de casinhas, as nuvens bem escuras encobrindo as nuvens claras, o horizonte de construções aleatórias e sincronizadas, o semblante terno do rapaz empinando pipa sozinho no meio da rua (o que será que estava passando na cabeça dele?). Por que será que fiquei sem jeito de oferecer ajuda para a moça que abria o portão com uma bebezinha no colo? Por que não vemos tantos detalhes no cotidiano? A vida é incomensurável!

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Quadro rep bardei tiu iu {DIY}

Quadrinho feito com feltro e bastidor de madeira. Usei para decorar uma mini festinha de aniversário. Mostrei também o jeitinho que costumo usar para copiar coisas do computador sem impressora… Direto na tela! A gente se vira! O suporte do final comprei na loja Daiso. Inspirem-se! (ˆ◡ˆ)♥

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28/04/22

Estava voltando dos Correios quando passei por uma calçada, com uma rampinha de elevação. Ali por baixo passa um córrego. Tem uma muretinha de proteção de cerca de 1m de altura. Era por esse caminho que eu passava para ir e voltar do prézinho quando eu tinha uns 5 ou 6 anos. Isso há 30 anos. Fazia tempo que eu não passava por ali. No momento em que meus pés subiram a mini rampa, voltei naquele tempo passado. Fechei os olhos, pude sentir. Sem hesitar, me aproximei do muro. Toquei com as mãos e o coração todinho. A vista nem é bonita. Nem o sentimento. Uns segundos de nostalgia boa. O resto da tarde com tristeza nos olhos. Eu quis muito me aproximar e sentir aquilo. Foi por impulso mas foi genuíno e verdadeiro. O que veio depois foi a lembrança amarga de como eram todas as vezes, todos os dias que passávamos por ali. Minha mãe sempre brigava. Eu e meu irmão tínhamos curiosidade, como toda criança (ou toda pessoa!?) normal. Era uma calçada diferente. Tinha cheiro diferente, textura diferente, altura diferente, largura diferente. Ela só gritava para prestar atenção, ir rápido, não olhar. Eu não conseguia entender. Precisava saber o que tinha ali, por que era assim, por que não podia olhar. Eu não podia sequer questionar. Ela tinha o hábito de dar tapa na minha boca. Com uma força absurda que só de lembrar, sinto o gosto de sangue misturado com minha saliva. O gosto que senti hoje, é aquele de quando a gente vomita e não tem mais nada para sair, só o azedume da bile. E os gritos na mente de “Sai dai”, “Se encostar ai vou te arrebentar”, “Se você se sujar vou esfregar a roupa na sua cara”. Não era por zelo, por cuidado. Não era mesmo! Aquela muretinha que outrora era gigante, hoje, hoje mesmo que permanecendo igual, parecia um rodapé. Mentalmente peguei eu criança no colo e me mostrei a vista. Me expliquei o que era um córrego. Me orientei para tomar cuidado. Me abracei e me pedi para silenciar os gritos (que até hoje ouço em vários momentos, em muitos momentos!) que não eram sobre mim. Eu não era a culpada. Eu não sou a culpada!