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20/11/22

“Cabelo horrível. Tem que cortar esse cabelo.” Todas as vezes que eu olho no espelho, ouço essa frase que minha mãe sempre me falou. Não estou exagerando. 100% das vezes que olho no espelho, eu ouço essa frase novamente. Só que agora, agorinha agorinha, bem recente, tenho contornado a situação. Eu ouço e me repreendo. Eu ouço e digo um sonoro não. Eu ouço e reafirmo que é belo, é perfeito, é como deve ser. O reverencio, o acarinho, o agradeço. Sinto os fios, as texturas, as cores. Amo o mesclado de branco. Quando quero, aliso um pouquinho. Por querer mesmo e não por imposição, inquietação em domar seu volume. Por enquanto não desejo mudar sua cor, esconder a idade. Hoje não. Hoje ainda não. Esse negócio de entender as pessoas, respeitar as pessoas é necessário, inquestionável. Mas tudo em excesso é ruim. Até o bom em excesso é ruim. Nessa de respeitar a visão da minha mãe, de entender que é o jeito dela, que é dela, me quebrei todinha. E me reconstruir todo dia, todo tempo, é exaustivo demais. Ela nunca gostou de cabelo grande, cabelo não liso, cabelo não preto. Ok. Sempre criticou cabelo não dela. Sempre ficou muito confortável em esnobar o meu. Cabelo bom é o dela que nem precisa de shampoo, nem precisa de alisar. Quando eu era pequena e pedia condicionador, era um absurdo eu querer essas frescuras. Devia ser inveja do irmão que sempre teve o shampoozinho de neném dele separadinho de todos por causa da irritação nos olhos. Que heresia eu não querer o 2 em 1 que a casa toda usava. Veja só, uma menina, criança querer ter voz e não cortar o cabelo sempre Joãozinho igual o do irmão. Depois não querer ter mais franjinha que era cortada em casa e ficava sempre em ziguezague. Ia crescendo e deixando o cabelo crescer. Até chegar na cintura. Cabelo horrível. Tem que cortar esse cabelo. Repetia-se todo dia essa frase. Até que veio a maternagem. Fui convencida de que o cabelo na cintura era mesmo horrível e tinha que cortar já que agora teria trabalho com a bebê e não poderia perder tempo cuidado daquele cabelo horrível que tinha que cortar. Cortei nos ombros. Me perdi de mim. Mãe é só cabelo preso, coque. E olha só. Meu cabelo ainda continuou sendo horrível e precisando de cortar. E depois ainda horrível precisando de cortar e de pintar. De qualquer forma, em qualquer tempo. Sempre horrível precisando de cortar e de pintar. E por mais que eu saiba que não devo me abalar com a opinião de uma pessoa que não eu, adivinha!? Eu me abalo. Sempre. E como sempre me foi muito fácil me anular e cuidar de terceiros, me anulo e blindo os meus filhos. Meu caçula tem o cabelo ondulado lindo. Sempre, pra minha mãe, precisa cortar. Eu elogio e deixo ele escolher o que fazer com o cabelo dele. Meu do meio tem cabelo liso. Agora está grande. Comentário sexista nem entra no caso. Eu elogio e deixo ele escolher o que fazer com o cabelo dele. Minha mais velha, tem o cabelo liso também e sempre gostou dele grande.  Eu elogio e deixo ela escolher o que fazer com o cabelo dela. Ela faz tempo que escolhe sozinha. Minha tarefa sempre foi reforçar que é lindo e ela não precisa cortar se não quiser. Tínhamos umas rusgas por tintura quando novinha. Agora ela quem manda mesmo. E mesmo com a maternidade, nunca vou dizer a ela que cuide primeiro do bebê e não de si. Não quero que se perca como me perdi de mim. Nem pelo cabelo e nem por nada mais. Quero que os três nunca pensem em cabelo. Tenho um desconforto enorme em salão de beleza. Agora eu corto o meu cabelo sozinha em casa. Vontade de ficar careca vem e vai. Há uns anos eu joguei fora o espelho do meu quarto. Há uns meses eu tive vontade de comprar um espelho novamente. É tanto conflito aqui dentro. Cabelo é só cabelo. Um dia eu vou consegui olhar no espelho e ouvir silêncio. Hoje eu já consigo depois de, acolher. Que bom! 

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31/08/22

Estava fazendo umas fotos em meu ateliê quando botei reparo na minha plaquinha que ganhei do Youtube pela marca de 100 mil inscritos no canal. Ela sempre está ali na parede, perto da mesa de trabalho, bem visível. É uma recompensa bacana por tanto esforço e motivo de alegria. Os filhos mostram orgulhosos para todo mundo. Tenho um certo receio sobre isso.

Reconhecer as próprias conquistas. Um ponto que preciso trabalhar. São só números. Não podem nos definir, nos rotular. Mas também não podem ser ofuscados por modéstia. O criador de conteúdo precisa fazer malabares com o algoritmo. Quando pensa que conhece o jogo, as cartas embaralham novamente e tudo muda. O tempo todo! Precisamos avaliar com cautela quais as batalhas que queremos enfrentar. Meu crescimento no Youtube foi totalmente orgânico. Reconheço que não sou camaleoa e não me adapto a todas as mudanças diárias que acontecem. Continuo formiguinha enquanto as grandes equipes fomentam boa parte ali. As vezes acho que me acovardo. Outras tantas, sei que dou meu melhor e coloco o pé no freio quando preciso tomar fôlego. Gostaria de crescer mais e mais. Tenho outras prioridades na vida pessoal. Luto, corro, respiro, desisto, recomeço! E de novo. E de novo. Enquanto me fizer bem. Por hora ainda faz sentido. Que bom! 

Gostaria de deixar algumas reflexões sobre internet, redes sociais, algoritmo. E nossa sanidade. Ali falei como criadora de conteúdo. {De uma forma geral já que também alimento outras redes, inclusive aqui, blog, que já reinou há eras, hoje são raros.} Aqui, como consumidora de conteúdo digital. Acredito que somos nós quem criamos nossa timeline. Nós que somos responsáveis por isso. Cada um. Claro que no caso das crianças, a conversa é outra. Mas como adultos, temos que saber que fazemos escolhas o tempo todo e não escolher também é uma escolha. De forma geral, o mundo funciona com o cada um por si. Cada um por seus próprios interesses. Ai cada um escolhe seguir por si ou se juntar aos semelhantes e lutar juntos. Por seu grupo ou pelo todo. A decisão inicial é sempre pessoal. Você escolhe, escolher ou ser massa de manobra. Para mim, o algoritmo é ótimo somente no aplicativo de música que define meu flow. Vez ou outra, reajusto. Quase sempre flui bem. Eu escolho o que quero consumir! E a hora de tirar meu time de campo. Agora no Instagram tem opção de organizar seu feed com seguindo e favoritos, em ordem cronológica!? Sabemos que interagir com o que você gosta, faz aquilo crescer. Ou deixar o algoritmo decidir tudo por você. Assim como nós, e tudo mais, os aplicativos precisam se atualizar com frequência. Uma época o que agradava um grande número de pessoas, eram as salas de bate papo. Depois os fotologs. Os blogs. As redes de amizades. De textos curtos. De imagens. Hoje cada um deles quer abranger o quanto puder. Há uns anos o Snapchat estava em alta. O Instagram precisou trazer os filtros pros stories para não ser engolido. Agora o Tiktok está em alta e todas as redes estão incluindo os vídeos curtos para não serem esquecidas. Todos vão se adaptando. Imagino que tem espaço para todo mundo, para todos os gostos. Particularmente, amo blog. Sou apegada no Twitter. E no Instagram. Pode ser porque gosto de ler, escrever e de fotografia. Amanhã posso não gostar mais tanto assim. Eu mudo. As pessoas mudam. Isso é bom! Mais importante: tem que ser leve e divertido. Senão, não use! Usemos com consciência! O aplicativo e a vida! 

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10/07/22

Não consigo lembrar onde ouvi, ou li, mas a frase me fez explodir a cabeça e desde então fica ressoando todo dia, o tempo todo. 
“Meus pais sempre me falam que eu não fui planejado, que eu não deveria ter nascido. E deve ser esse o motivo por eu nunca ter me sentido em casa nesse mundo. Sou aquela visita indesejada. Sou o intruso. Eu não deveria viver aqui nesse planeta.”
E pra mim fez tanto sentido pois é exatamente o que sinto. Como sempre me senti. O que sempre ouvi. Que ouço até hoje. Sem sutileza, sem compaixão. Dói. Rasga. Sangra. É aquela ferida que nunca cicatriza. E quando parece que há cicatriz, a pele abre novamente, revira toda a carne e fica inflamado, infeccionado, putrificado. 
Se o assunto surgir todo dia, todo dia minha mãe confirma. Meu irmão nunca imaginou que essa “brincadeira” pudesse doer por que nele nunca doeu. E ele adora relembrar, reafirmar, desdenhar. Na frente do meu pai, jamais, mas ele também tinha muitos fantasmas e um grande abismo entre nós. 
Isso me fere principalmente depois de me tornar mãe. Nunca faria isso com um irmão, menos ainda com um filho. Sou totalmente a favor do aborto apesar de imaginar que nunca faria. Nunca me passou pela cabeça. Fui mãe solo, adolescente. É de uma insanidade sem limite. Absurdamente insano. Intensamente insano. Nem por um segundo achei que minha filha foi um erro. Nunca! Nunca sequer fiz referencia. Me dói imaginar que possa alguma vez ter passado isso pela cabeça dela ou dos outros dois filhos. Me tranquiliza saber o que sinto, o que sempre senti. Reafirmar a valia deles e o amor, fundamental! 
Soma-se o não pertencimento ao seio familiar com os relacionamentos fracassados, bingo! Minha inadequação e inabilidade social… Nunca me senti parte desse mundo! 

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Desejos

Eu quero descobrir quantas cores tem seus olhos.

Eu quero massagear o seu rosto até a ruguinha apreensiva do meio da sua testa desaparecer.

Eu quero entrelaçar os meus dedos na sua barba.

Eu quero a conchinha por trás para cheirar o seu cangote.

Eu quero contar quantos palmos que tem as suas costas.

Eu quero fazer carinho na sua panturrilha com o meu pé.

Eu quero contar as pintinhas da sua barriga.

Eu quero saber quais são seus livros, séries, filmes e músicas favoritas.

Eu quero ouvir você listando todas as cidades que quer conhecer e os países que quer morar.

Eu quero sentar no meio fio com você e virar a noite conversando.

Eu só queria que você me quisesse…